Campo Grande (MS) – No vinagrete do tradicional churrasco, na massa da conhecida sopa paraguaia ou no convencional bife do horário de almoço, a cebola está entre um dos vegetais mais presentes na cozinha do sul-mato-grossense. Contudo, o quadro se inverte quando o assunto é plantio, uma vez que é rara a presença do alimento nos canteiros dos sítios e assentamentos da agricultura familiar do Estado.
Para reverter esse quadro a Agraer (Agência de Desenvolvimento Agrário e Extensão Rural) está com um projeto piloto no assentamento Vinte e Cinco de Março, no município de Três Lagoas, para testar a viabilidade da produção da cebola nas terras dos agricultores familiares que recebem a assistência técnica do executivo estadual.
Uma dos agricultores que abriu as porteiras do sítio para o experimento foi Júlio César Saito. “Nosso foco é a horticultura. Mas, procuramos alternativas de melhorar a nossa renda e encontramos no projeto da Agraer essa opção. No inverno temos o excesso de folhas no mercado, o preço cai e, às vezes, não se consegue vender tudo o que produz. Então, encontramos na cebola uma janela para o inverno, um meio de se tornar competitivo”, disse.
O projeto com a cebola surgiu entre o casal, Sônia Komori e Humberto Sampaio. Ela técnica da Agraer e ele pesquisador que já tem estudos com a cebola pelo interior de São Paulo. “A Agraer é parceira nossa e sempre vem dando acompanhamento, trazendo novidades, informações e apesar de ser piloto e não ser específico para nós, o projeto vem de São Paulo, a gente tem tido bons resultados”, conta o produtor.
Segundo ele, a técnica da Agraer teve uma sacada genial em unir o trabalho do esposo com as ações da Agência e o entusiasmo dos agricultores familiares da cidade. “O esposo dela é pesquisador e tinha sementes de cultivares que estão em estudo. Ela trouxe as sementes e foi muito bem aceito na região”.
A receptividade foi tão boa que só Júlio tem quatro cultivares em 150 m² de horta. “É o segundo ano do projeto. Eu e minha esposa, Rosane, começamos com 80m² em 2016 e quase dobramos a área este ano”, afirma o produtor que dentre as variedades cultiva a cebola roxa, “Escolhi a roxa, primeiro, porque gosto mais do sabor do que da branca e outra porque ela tem mercado garantido, poucas áreas do Brasil plantam e, aqui, no Estado, ela chega um pouco inflacionada no mercado”, explica.
No Brasil os grandes produtores são Paraná, São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Tocantins e Santa Catarina – estado que é considerado o campeão em termos de produção. “A produção local é lucrativa para o agricultor, mercado e consumidor. Os gastos com o transporte, combustível e tempo de viagem são menores e isso repercute no preço e na qualidade do que vai para mesa”, garante Saito.
Em Três Lagoas, a produção ainda é tímida, entretanto, a comercialização é certa, conforme alega a técnica da Agraer, Kimori. “Tudo será entregue na merenda escolar pelo Pnae [Programa Nacional de Alimentação Escolar] e para a Conab via PAA [Programa de Aquisição de Alimentos]. Os preços variam entre R$ 2,71 a R$ 2,90 o quilo e, na feira livre, aonde a cebola roxa chega a R$ 6,00 o quilo”.
“O preço da cebola roxa já chegou a R$ 9,00 o quilo e não fica a menos de R$ 5,00 o quilo. O Custo de produção ainda é alto ao pequeno produtor de Mato Grosso do Sul já que não temos tradição no plantio. Ele fica entre 1,50 a 1,30 o quilo, valor um pouco alto vendo que em outros estados o custo pode ficar a menos de R$ 1,00. Mas, tudo é uma questão de fazer virar um polo produtivo”, afirma o agricultor.
Mesmo com um custo benefício ainda longe do ideal, o agricultor não troca a experiência para ficar apenas nas hortaliças. “É um produto que pode ser armazenado por até três meses, ou seja, a gente pode segurar e conduzir as negociações. Já dependendo das folhosas você tem questões de dias para vender. Se não vender já perde”.
“Identificamos na cebola o que pode ser um grande potencial de investimento em nossa região. Temos um clima favorável, produtores interessados e um mercado amplo a ser explorado. Desde 2015, estivemos testando em áreas pilotos e, agora, em 2017, plantamos diferentes tipos de cebola e distribuímos a diferentes produtores”, afirma a técnica da Agraer que ainda complementa, “Embora o nível de tecnologia e manejo ainda não sejam as ideais à cebola, obtivemos resultados muito satisfatórios praticamente em todos os cultivos, o que foi demonstrado no dia de campo”.
“A cebola impacta em 35% em cima da renda do agricultor familiar. Nesta época do ano, inverno, não tem uma boa janela de preço para as folhosas. Pensando que a cebola é um alimento que pode ser cultivado o ano inteiro é uma cultura que pode ser dominada. Nosso único desafio é no verão em que o excesso de água pode prejudicar”, afirmou o agricultor Júlio César Saito
Só no assentamento Vinte e Cinco de Março são 15 pequenos produtores que resolveram aderir ao projeto. “O pesquisador Humberto e a Komori tiveram a ideia e a gente tem o trabalho. Nada melhor do que a prova no campo para saber se há aptidão para o cultivo de cebola. Por mais que eles sejam pesquisadores não tem como saber sem a prática. Na base de pesquisa controla tudo, proteção, clima, data exata de colheita. No campo nem sempre é assim. A empresa doou as sementes, a Agraer atende a gente e nós trabalhamos”, avalia com bons olhos o agricultor Saito.
Ao todo são 11 tipos de cebolas que estão em fase de estudo em Três Lagoas pela Agraer, são elas: IPA 11 (Hortivale), Solaris (IAC), Predator, Mirela, Taila, Patrícia, Luminosa, Red Coach, Malbec, Annika e Python (Enza Zaden). “Ainda não temos o resultado, pois não foram todas colhidas, mas todas tiveram boa produção, com exceção da Mirela que não apresentou bom desenvolvimento”, revela Kimori.